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Blogtailors - o blogue da edição

Grupos Editoriais / Editores "independentes", por Nélson de Matos

31.10.07
Nélson de Matos, aquando do encontro da semana passada na Casa Fernando Pessoa e tal como tinhamos referido num post anterior, optou não se pronunciar. Felizmente, o Nélson de Matos levou o nosso post como um desafio, e como tal publicou no seu blog um texto sobre o assunto. Este texto, informa-nos o editor, «foi lido na Gulbenkian durante o 1º Congresso de Editores, realizado em Abril de 2001. Com pequenas adaptações, foi mais tarde publicado (13.09.2003) no DNA.» Aqui fica:


A presença de Grupos empresariais na área da edição ou da comercialização do livro, não está em Portugal ainda suficientemente tratada, provavelmente por não temos ainda para a pensar nem a experiência, nem os dados, nem o distanciamento suficientes.

Em algumas intervenções recentes, tenho ouvido classificar esta situação – repetidamente – como de uma “grave ameaça” para o nosso mercado.

É evidente que esta é uma forma barroca (e bacoca?) de considerar o problema. A não ser que consideremos “ameaçadora” a própria realidade em que nos movemos.

Em toda a parte tem sido esta a tendência dominante no mundo empresarial, não apenas no sector da edição. As empresas associam-se, fundem-se, constituem grupos poderosos, internacionalizam-se, os grandes envolvem os pequenos, procuram novos mercados para um mais largo exercício da sua actividade.

São um dos efeitos da globalização, como agora se diz. Não há nada a fazer. Ou melhor: não está nas nossas mãos fazer diferente, enquanto esta for a tendência dominante da economia mundial.
Esta é a realidade com que temos de contar no nosso dia a dia, não vale a pena fugir dela. Tão-pouco considerá-la “ameaçadora”, porque não será isso que a transformará.

O que temos é de aprender a viver com ela, modificando alguns dos nossos critérios profissionais e de gestão, as nossas estratégias empresariais, explorando as oportunidades e os espaços que consideramos poder e dever ocupar.

Os Grupos não são necessariamente "inimigos", nem são irremediavelmente “maus”, antes, em alguns casos, poderão ser parceiros interessantes para o contraste e alargamento das nossas próprias experiências, para o desenvolvimento da nossa criatividade e capacidade de reacção.

Mesmo em Portugal, onde estas coisas chegam sempre com atraso, algumas destas tendências manifestam-se já desde há alguns anos, não são uma realidade nova. Começaram na área da comercialização com o aparecimento das grandes superfícies de venda, os hipermercados, todos integrados em grupos empresariais poderosos; passaram depois pela formação de fortes grupos livreiros nacionais como foi o caso das dezenas de livrarias da Bertrand, culminaram com a chegada ao nosso mercado de um grupo europeu como a Fnac, já com várias lojas em funcionamento, e alguns outros se aproximam, como por exemplo El Corte Inglês, que se instalou entre nós há menos tempo.

Mesmo na área da edição, poderemos citar a já antiga presença em Portugal do Grupo Bertelsmann, com o seu clube do livro, o Circulo de Leitores e com a Temas e Debates a sua editora dirigida ao mercado tradicional das livrarias; do Grupo Noticias/Lusomundo/Portugal Telecom, com a Editorial Noticias, a editorial Oficina do Livro, a sua distribuidora e a sua rede livrarias; da própria Dom Quixote hoje integrada no Grupo Planeta, o mais importante grupo editorial da Península Ibérica, ou de muitas outras iniciativas que todos sabemos se aproximam.
Todos estes Grupos têm estratégias ambiciosas, objectivos de liderança do mercado, alguns deles visam, inclusivamente, o objectivo mais largo de liderança em todo o espaço da língua portuguesa. Refiro-me ao Brasil e aos países africanos de língua oficial portuguesa.

A par desta actuação, coexistem evidentemente com o seu imprescindível e meritório trabalho muitas editoras designadas por “independentes” – embora esta designação mereça hoje, também, alguma clarificação. Dado que para se manterem “independentes” muitas destas empresas tiveram também de criar as “dependências” específicas que melhor lhes permitam resistir, persistir e actuar.

Quanto a mim, encaro com poucas diferenças a dependência de um Grupo empresarial de edição, da dependência de um Banco, de um Distribuidor, ou até das poderosas redes livreiras existentes no mercado. Ou melhor: porque já tive as duas experiências, prefiro de longe a dependência de um Grupo profissional com quem possa partilhar objectivos similares.
Os verdadeiros editores são, como se sabe, por princípio e definição, “independentes”... quer exerçam a sua actividade no interior de um Grupo, quer isoladamente.

Todos compreendemos hoje que só obtendo resultados se garante a sobrevivência a médio e longo prazo, e que esta é uma regra a que nenhuma empresa (pequena ou grande, “independente” ou em Grupo) poderá fugir. Para isso, cada um cria as dependências que considera mais convenientes para salvaguarda da continuidade do seu trabalho. Até mesmo os editores que gostam de continuar a designar-se como “independentes”...

Nos últimos anos, em Portugal, a propósito da falência de uma grande Distribuidora nacional e das graves consequências dessa situação para muitos pequenos editores “independentes”, tenho ouvido culpar a lógica e o funcionamento dos grupos empresariais que entre nós actuam na área da comercialização.

Trata-se evidentemente de uma reacção emocional, muito motivada pelas previsíveis dificuldades que terão de ser geridas por essas dezenas de pequenas editoras, que recorriam antes aos serviços e ao apoio financeiro da referida Distribuidora.
Aqui, como em tudo o mais, há pois que saber controlar as nossas emoções e preocupações, tentando encontrar a correcta análise da realidade.

Os Grupos não podem ser responsabilizados por todas as nossas “desgraças”.

E, evidentemente, não parece correcto, tal como aconteceu nessa altura, tentar solicitar que seja o Estado, torneando provavelmente a legislação europeia reguladora da concorrência e do funcionamento do mercado, a intervir em casos como esses, moderando a capacidade de gestão dessas unidades empresariais relativamente a outras que operam em idênticas condições e circunstâncias de mercado.

Portugal pode dizer que tem hoje um público de leitores e de compradores regulares de livros que antes não existia – pena que as pobres estatísticas oficiais (referidas ainda aos anos em que nem sequer existiam Fnacs...), nos não consigam mostrar mais do que uma arqueologia do sector. E onde há mais leitores e mais leitura aumentam certamente as oportunidades para as empresas do sector do livro, tanto editores como livreiros.

Por formação cultural, eu não sou partidário (como parecem ser alguns dos nossos actuais responsáveis culturais) de um total liberalismo de funcionamento do mercado. Trata-se afinal da cultura de um país, do modo como nos vemos uns aos outros, ou de como queremos ser vistos do exterior. A cultura é a nossa cara, e mais do que a nossa cara é a nossa respiração.

Deixá-la entregue, livremente, com todas as suas fragilidades e especificidades, às puras regras de funcionamento do mercado é correr o risco do que pode designar-se como o fenómeno “Big-Brother”. Se o mercado exige, é isso apenas o que devemos fornecer-lhe…
Não pode ser assim... os gostos educam-se, o “pensar” ensina-se, e todos (incluindo o Estado) teremos de fazer algum esforço nesse sentido.

Mas também não pode exigir-se ao Estado que intervenha fora dos limites da sua função reguladora. O apelo vulgar e sistemático à intervenção do Estado nas situações de crise, só pode ser revelador da nossa falta de capacidade para encontrar as soluções adequadas para os problemas que teremos de ser nós a resolver.

Eu costumo dizer que devemos deixar (e sobretudo vigiar) que o Estado cumpra o seu papel e faça o trabalho que lhe compete: que produza e melhore a legislação necessária (uma boa Lei do Preço Fixo dos livros, uma mais clara legislação sobre a concorrência, um Código do Direito de Autor adaptado aos tempos modernos, etc.); que promova na actividade escolar o gosto dos jovens pela leitura e pelo estudo do nosso património literário; que intensifique o alargamento da rede de bibliotecas escolares e de leitura pública; que apoie o reconhecimento externo da nossa língua e dos nossos escritores; que apoie a edição, não estritamente comercial, do nosso património literário fundamental; que compre livros para as bibliotecas pelas quais é responsável, e não que legisle de modo a que estes lhes sejam entregues gratuitamente sob a forma de Depósitos Legais; que reflicta sobre os efeitos desse verdadeiro imposto sobre a leitura que é o IVA aplicado aos livros; ou que, ao menos, aproveite as receitas do IVA para reais acções de dinamização da leitura, etc.

O que não podemos é exigir do Estado que corrija as más decisões dos gestores editoriais.
Os Grupos empresariais na área do livro ocuparam o seu espaço em Portugal tal como aconteceu noutros países. Inundaram o mercado de muitos livros bons e de muitos livros maus, desenvolveram novas regras de funcionamento junto dos autores, aplicaram ao livro e aos seus produtores novas regras de comercialização, de marketing, de venda. Introduziram no mercado as suas regras de funcionamento, a sua elevada capacidade negocial, mas também um maior dinamismo, imaginação e criatividade que foram capazes de abrir novos espaços para a leitura, o lazer, a aprendizagem através do livro.

Construíram além disso uma indústria editorial mais forte. E sem uma indústria editorial forte não há espaço de trabalho independente para os criadores ou para os profissionais do sector.
Os Grupos não publicam só best-sellers, ou só lixo editorial. E sobretudo não são sequer os únicos a fazê-lo…

Só criando novos leitores se aumentam os hábitos de leitura permanentes; só despertando o interesse pela leitura se formam leitores cada dia mais capazes de livremente seleccionar aquilo que querem ler.

Cabe-nos a nós a adaptação e o contraponto a estes desafios. O que não podemos é continuar a repetir a filosofia da desgraça e da crise permanente, ou a solicitar o paternal apoio do Estado perante estas ditas “ameaças” – onde apenas nos é exigido uma melhor definição e ocupação do espaço enorme que nos sobra para o exercício da nossa criatividade e profissionalismo.

O mercado está a crescer acentuadamente, pelo menos em Portugal. Há que aproveitar as suas oportunidades.

A presença dos grupos de edição ou de comercialização do livro tornou o nosso mercado mais dinâmico, aberto, competitivo. Cabe aos editores e livreiros “independentes”, retirarem disso, com imaginação e trabalho, maiores benefícios e oportunidades.
Ou unirem-se, também, é outra possibilidade.

Diz-se...

31.10.07

Sobre as capas:

“Nós não lançamos um livro do Umberto Eco ou do Saramago, lançamos do David Liss ou da Janet Wallach, que são excelentes autores, têm grandes livros mas ninguém os conhece, não vendem pelo nome. Então como é que vendem? A primeira aposta é na capa. Quem entra numa livraria tem que olhar para os nossos livros antes de olhar para os outros. Tem que os folhear, tem que ver uma paginação bonita, algum design interior pensado, não é só um logótipo a preto e branco e toca a despachar! Não, os livros dão algum trabalho e nós temos tido bons resultados com isso.”

Luis Corte Real, Os Meus Livros, Janeiro 2006, p.20

Edição em Desassossego (2)

31.10.07
Voltamos, então, à sessão da passada quarta-feira na Casa Fernando Pessoa, sob o tema da Concentração Editorial.

Uma dos temas abordados nessa sessão foi o papel do editor nas novas estruturas.

Tendo sido referido pelos respectivos CEO’s dos grupos representados que os editores das empresas compradas iriam manter as suas função «como anteriormente», a verdade parecia ser sempre diferente vista à luz dos respectivos interlocutores.

Se, por um lado, é referida a pretensão de manter as linhas editoriais e o processo de escolha de programação, por outro, é referida a necessidade de uma maior segmentação de cada uma das editoras (Isaías Teixeira Gomes), o que significa que não poderá permitir que as editoras actuais se desposicionem da forma como o têm vindo a fazer.
Igualmente, é referida a alteração do processo de edição executiva, que passa a ser partilhada entre o editor e um «gestor de marca», alguém cuja especialidade é observar à luz das necessidades e objectivos da empresa a validade das escolhas editoriais.

Face a isto, o processo de decisão do editor fica subalternizado e dependente de uma co-avaliação, o que levará, na melhor das hipóteses, somente à manutenção da parte mais importante para o grupo da linha editorial anterior.

Francisco Vale também referiu um facto importante, que deriva de muitos dos projectos anteriores (referia-se em particular à Teorema) terem por detrás um espírito de projecto pessoal que leva a uma maior entrega e comprometimento nas escolhas. De facto, Francisco Vale colocava a questão: «será que um editor que vendeu a sua empresa e que agora irá executar a mesma função para outros, [tendo de cumprir os objectivos dos outros,] irá conseguir ter a mesma entrega e capacidade de arriscar?» De facto, não passará esse editor a ser somente alguém que tentará manter uma linha anterior, uma gestão editorial operacional?

João Rodrigues acrescentava o facto de muitos editores que ele conhece – mormente em Espanha, segundo disse – que entraram nesse processo acabaram por ter de abandonar os seus anteriores projectos, pois não tinha sido possível manter a mesma liberdade de escolha, tendo sempre havido um ponto de ruptura onde o representante do detentor do capital (gestor) acabava por sair como vencedor.
Nelson de Matos, apesar de ter estado presente e para pena de todos, absteve-se de comentar o tema – apesar de já o ter vindo a fazer publicamente em algumas ocasiões.

Face a estas questões não foram apresentados muitos argumentos em contrário, tendo o mercado e os editores que passaram a estar nessa situação de esperar para ver.

(a continuar)

Quotas

31.10.07
Mil perdões para quem esperava ontem a continuação do Edição em Desassossego, mas os valores de mercado da Gfk (4.º grupo mundial de estudos de mercado) são um tema de importância extrema (dada a falta generalizada de informação) e o post acabou por não sair no dia de ontem.

Em relação aos valores de mercado, o estudo da Gfk representa somente as vendas no retalho de highstreet, rede de livrarias e hipermercados (cerca de 700 pontos), através do cálculo dos valores à boca de caixa.
Nos primeiros seis meses de 2007 venderam-se, desta forma, 7,3 milhões de livros, sendo de recordar que o 1.º semestre é sempre mais fraco do que o 2.º semestre em termos de vendas - aliás, um dos desequilíbrios deste mercado:

Valor de quota por segmento:
- Literatura geral: 28,3%
- Infanto-juvenil: 19,9%
- Turismo e Lazer: 13,7% (em parte devido ao período das pré-férias)
- Ciências: 10,9%
- outros: abaixo de 10%

De realçar que os hipermercados já ultrapassaram neste estudo a quota dos 30% (31,4%).

RBA compra Hachette Filipacchi Publicações

30.10.07
Via Con Valor e «Meios & Publicidade».

Felizmente os nossos amigos de Espanha estão atentos e interessados, pelo que tivemos conhecimento que a RBA comprou a Hachette Filipacchi Publicações - Portugal, cuja presença no nosso país se limita às publicações periódicas, tendo na sua carteira a revista «Elle», «Ragazza», «Premiere», «Casa Dez» e «Cozinha Dez».

A RBA Edipresse publica em Portugal a revista «National Geographic», aumentando assim consideravelmente o seu portefólio.

Indústrias Culturais, por José Afonso Furtado

30.10.07
Para quem espera a continuação do Edição em Desassossego, a mesma aparecerá da parte da tarde.

Entretanto, e porque de facto merece a pena ser lido, deixo-vos o texto que José Afonso Furtado leu no lançamento do livro Indústrias Culturais - Imagens, Valores e Consumos, de Rogério Santos - oriundo do blogue homónimo -, e publicado pelas Edições 70.

«Como a intervenção é curta, seleccionei dois pontos que gostaria de referir.

O primeiro tem a ver com os blogues em geral e o Indústrias Culturais em particular, já que a quase totalidade dos temas, textos e imagens agora recolhidos na obra tiveram a sua origem naquele blogue.

Chris Anderson, escreveu em Maio de 2005 no seu blogue The Long Tail, que a primeira regra da blogosfera é evitar generalizações sobre os blogues, com o que pretende significar que é inútil tentar transformar os blogues numa instituição como o jornalismo, por exemplo, pois eles são muito diversos em termos de conteúdo, qualidade, ambição e sensatez. E se o seu modelo óbvio de configuração formal é o diário, ele pode ser íntimo ou intelectual, mundano ou cultural, pois os blogues resultam de diferentes motivações sociais e são, basicamente, individuais. Apesar disso, Rebecca Blood refere que a maioria dos blogues seguem ainda hoje o seu formato inicial, apresentando links para zonas da web ou para artigos e notícias consideradas relevantes, quase sempre acompanhados por curtos comentários. Contudo, o crescimento exponencial da blogosfera veio questionar esse formato, pois os blogues tornaram-se tão numerosos quanto difíceis de navegar e tão confusos como a própria web para o utilizador pouco experimentado.

Desse modo, a par do estilo «links e comentários pessoais», os blogues têm vindo a aproximar-se do modelo «website regularmente actualizado com novos posts no início da página», o que não deixará de ter relação com o facto de profissionais e investigadores usarem agora os blogues para reflectirem sobre o seu trabalho, para acompanharem os desenvolvimentos no seu campo e para publicarem ou testarem as suas ideias. Os blogues são assim profundamente maleáveis como são inúmeras as formas que podem assumir, muito embora quase todos privilegiem a divulgação de informação e a interacção com uma comunidade de interesses. Acrescente-se aliás que o seu sucesso depende em grande medida da qualidade e da relevância dos seus conteúdos para essa comunidade.

Posto isto, como caracterizar o «Indústrias Culturais»? Tendo começado por assumir um aspecto pedagógico de suplemento das aulas do seu criador, centrado essencialmente na genealogia e teorização do conceito de indústrias culturais e de indústrias criativas, rapidamente as características do meio e as idiosincrasias do blogueiro, levaram a uma verdadeira «explosão» temática. Encontramos assim num só blogue uma diversidade de formatos, correlato da multiplicidade de interesses do seu responsável, e que oscilam, nas suas próprias palavras, entre dois polos: «a perspectiva clássica da academia em termos de reflexão» e «o trabalho jornalístico de abordar os temas agendados e de actualidade».

Cremos que a importância, a originalidade e o sucesso deste blogue têm a ver com as suas sólidas reflexões teóricas, por vezes próximas do modelo «Thinking by Writing», com o seu papel de filtro e de organizador de agenda (o termo é de Jose Luis Orihuela) - resenhas, notas de leitura, análises e sugestões -, com a sua atenção aos acontecimentos nas áreas das artes e espectáculos e à agenda mediática e, certamente, com a exuberante diversidade das suas «obsessões». Rogério Santos pertence claramente à categoria dos consumidores insaciáveis (omnívoros) segundo o modelo de Jordi Lopez e Ercília García, modelo que ele analisa detidamente, o que aliás me permitiu conhecer o seu interesse pela zarzuela!

Por outro lado, algumas vezes o blogue transforma-se em metablogue e o blogueiro em teórico da blogosfera. Numa desses momentos (22 de Abril de 2005), Rogério Santos faz uma chamada de atenção para a absoluta necessidade de um mínimo de regras de conduta, num momento em que se assiste a uma progressiva mercantilização da blogosfera, a uma expansão do que chama blogues de entretenimento e em que muitas vezes se verificam casos de «cibervandalismo». Gostaria de enfatizar a importância desta questão da ética na blogosfera, porventura decisiva para a sua credibilidade e sobrevivência a prazo. Mas, sobretudo, Rogério Santos manifesta uma constante atenção, disponibilidade e generosidade em relação a tudo o que de novo vai surgindo: reflexões de alunos, teses de mestrados, jovens blogueiros, novos criadores, primeiras obras … o que não deixará de contribuir para um efeito de rede, para a criação de novas formas de sociabilidade e de comunicação interpessoal.

O segundo ponto que gostaria de referir muito brevemente é o da relação entre blogues e livros. Chris Chesher refere que o autor, que muitos deram como ameaçado pelas características da escrita e do texto digital, afinal está vivo, encontra-se bem e tem um blogue. Blogue que de algum modo o perpetua, que com ele coexiste mas que também o transforma. Na verdade, os escritores lidam nesse ambiente com condições materiais dos textos muito diferentes das tradicionais. Os blogues não são livros: os livros são produzidos, distribuídos, promovidos e chegam ao consumidor através de pontos de venda comerciais (simplifico, naturalmente). Os blogues são criados por um indivíduo ou por um pequeno grupo, acessíveis com facilidade e distribuídos electronicamente quase sem custos. Por outro lado, os blogues operam numa ordem temporal muito diferente. Se os livros têm uma data de publicação (que apõe um selo ao seu conteúdo), os blogues lêem-se como uma espécie de narrativa em episódios e por ordem inversa. Mais ainda, se os textos de um livro são cuidadosamente organizados, formalmente expressos, completos e internamente consistentes, os blogues apresentam com frequência primeiros drafts, são coloquiais, familiares e fragmentários, e podem ter o imediato feedback dos seus leitores. Há uma autoria nos blogues, mas ela não se correlaciona com os mesmos campos sociais da autoria no impresso.

Nada que Rogério Santos não saiba. Como ele afirma, entre a edição na internet e a escrita em papel alteram-se os ritmos, os alcances de leitura, a organização de materiais e mesmo os próprios materiais. Acresce que «o livro em papel é ponto de chegada, sujeito apenas ao crivo crítico posterior dos seus leitores», enquanto «a internet é continuamente ponto de partida e ponto de chegada, aceitando a rasura, o retomar de um assunto como se fosse um diário ou uma conversa». Ou seja, como conclui lapidarmente, «o blogue é mais aberto que o livro, o livro é mais espesso que o blogue».

Não cabe aqui estabelecer hierarquias, pois a aparente debilidade de um blogue – o carácter efémero de muita informação – tem como contrapartida o seu dinamismo, facilidade de inserção de informação e reacção à leitura quase em tempo real, características que as novas ferramentas da chamada Web 2.0 vêm facilitar e expandir. Mas também porque, na terminologia de Eliseo Veron, com os blogues estabelece-se um novo «contrato de leitura», que pouco tem a ver com o posicionamento discursivo de outros media mais tradicionais.

Em conclusão, se a frequência do blogue de Rogério Santos é uma exigência para quem se interessa ou trabalha no campo das indústrias culturais, temos a partir de hoje acesso a um livro que com ele se não confunde, porventura a espaços mais focado e aprofundado nalgumas tematizações, e que é, a um tempo, uma obra teoricamente preciosa e um texto de leitura fascinante.

José Afonso Furtado»

Jorge Amado

29.10.07
O neto do escritor Jorge Amado pondera a hipótese de doar todo o espólio do autor a uma universidade norte-americana. Esta intenção surge na consequência da dificuldade em obter financiamento por parte do Governo da Bahia para a conservação das 250 000 peças que compõem o espólio.

O embaixador português no Brasil, Seixas da Costa, mostrou o interesse de Portugal em receber o dito espólio.

Por seu lado, Miriam Fraga, directora da Fundação Jorge Amado, já veio dizer que a doação do espólio para fora do Brasil será o último recurso.

Orfeu Negro - Nova chancela da Antígona

29.10.07
Orfeu Negro será o nome de uma imprint da Antígona, dedicada às Artes Contemporâneas. A apresentação do primeiro livro decorrerá amanhã, dia 30 de Outubro, no Lux Frágil, durante a qual será lançada o primeiro livro da editora: A arte da Performance: do futurismo ao presente, de RoseLee Goldberg.

Segundo o website da Antígona a nova editora caracteriza-se da seguinte forma: «Da dança à arquitectura, passando pela música, o teatro, a fotografia, o cinema e as artes plásticas, ORFEU NEGRO privilegia a transversalidade do pensamento artístico e as áreas híbridas da criação. Mito da transgressão, Orfeu representa também a aventura da criação artística. Orfeu Negro, designação furtada ao título do filme de Marcel Camus, que por sua vez adapta a peça Orfeu da Conceição, de Vinicius de Moraes, acrescenta mais uma leitura às várias interpretações.»

Caderno de Teoria da Edição

27.10.07
Gostaria de apresentar um novo blogue, irmão no tema, que surgiu para os lados da Avenida de Berna.
Trata-se de O Caderno de Teoria da Edição, um blogue idealizado por Rui Zink e implementado pelos seus mestrando do curso de Edição de Texto da Universidade Nova e que, esperamos nós, se irá juntar à pequena mas interessante comunidade de blogues de edição que começam a existir em Portugal.

Para já convido-vos a visitar O Caderno de Teoria da Edição.

Prémio José Saramago

26.10.07
valter hugo mãe, escritor e autor do blogue Casa de Osso, acaba de ganhar o Prémio José Saramago que visa distinguir autores com menos de 35 anos, com a obra «O Remorso de Baltazar Serapião», publicado pela Quidnovi.

Desde já damos os parabéns ao valter, mas ficamos com uma dúvida: não tens 36 anos?





Biografia do autor (texto e fotografia cedidos pela editora):

Nasceu em 1971, na cidade angolana de Saurimo.
Passou a infância em Paços de Ferreira e vive em Vila do Conde.
Licenciou-se em Direito e é pós-graduado em Literatura Portuguesa Moderna e Contemporânea.


Publicou nove livros de poesia, entre os quais três minutos antes de a maré encher, a cobrição das filhas, útero, o resto da minha alegria, livro de maldições e pornografia erudita. Recebeu o Prémio de Poesia Almeida Garrett da Associação dos Jornalistas e Homens de Letras do Porto com o livro egon schiele, auto-retrato de dupla encarnação. Para além da escrita, estende ainda a sua actividade artística às artes plásticas.


Foi fundador e co-responsável pelas Quasi Edições, até 2004.


A obra (texto cedido pela editora):

Numa Idade Média brutal e miserável, Baltazar casa com a mulher dos seus sonhos e, tal como o pai fizera antes com a mãe e com a vaca Sarga, fêmeas irmanadas em condição e estatuto familiar, leva muito a sério a administração da sua educação. Mas o senhor feudal, pondo os olhos sobre a jovem esposa, não desiste de exercer sobre ela os seus direitos. Entregue aos desmandos do poder e do destino, Baltazar será forçado a seguir por caminhos que o levarão ao encontro da bruxaria, da possessão e do remorso.


Com um notável trabalho de linguagem que recria poeticamente a língua arcaica e rude do povo, o remorso de baltazar serapião, de valter hugo mãe — autor, entre outros, de o nosso reino, seleccionado pelo Diário de Notícias como um dos melhores romances portugueses de 2004 — é uma tenebrosa metáfora da violência doméstica e do poder sinistro do amor.

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